
Diante da tragédia ocorrida em Petrópolis, muito se questiona sobre os recursos aplicáveis para repor estragos na região.
Entre as discussões, muito se fala sobre a obrigatoriedade do laudêmio, uma taxa cobrada dos moradores de Petrópolis e várias outras partes do país que além de um vínculo antigo com a família imperial, parece não ter destinação clara nos tempos atuais.
O que é o laudêmio?
O laudêmio, apelidado de “taxa do príncipe”, é uma taxa criada no século 19 para compensar a Coroa Portuguesa pelo incentivo ao povoamento de determinadas regiões do Brasil.
Tudo começou quando Dom Pedro I comprou uma propriedade em 1830 chamada Fazenda do Córrego Seco. Hoje, o local é o Primeiro Distrito de Petrópolis.
Quando faleceu em 1834, seu terreno foi herdado por Dom Pedro II. Nove anos depois, ele decidiu arrendar a região, buscando uma ocupação planejada do local.
Foi assim que nasceu Petrópolis. Desde então, qualquer comprador de imóveis na região do Primeiro Distrito deve pagar 2,5% à Companhia Imobiliária de Petrópolis.
A taxa de laudêmio só pode ser paga à vista, sem possibilidade de parcelamento, e é condicionante para que o novo proprietário receba a escritura do imóvel.
Por que o laudêmio existe?

O laudêmio é uma taxa de “uso” de propriedades que ainda estão em propriedade da família imperial.
O Código Civil de 1916 explica a situação: os compradores de imóveis em Petrópolis seriam, na verdade, chamados enfiteutas ou foreiros — pessoas que possuem “domínio útil” de seus imóveis, mas não o direito de propriedade.
Como a família imperial é proprietária de direito dos imóveis da cidade, cobrando o laudêmio por meio de uma pessoa jurídica (a Companhia Imobiliária de Petrópolis), ela segue sendo proprietária dos bens, mesmo que não usufrua — ou seja, mesmo que nenhum herdeiro real resida efetivamente nas propriedades.
Ainda segundo o Código Civil, o proprietário poderia atribuir a terceiros o domínio útil, mas essa pessoa que o adquire deveria pagar uma espécie de “pensão, ou foro, anual, certo e invariável”.
Isso significa que mesmo que outras pessoas comprem esses imóveis, eles enfrentam restrições por não serem titulares do “senhorio direto” e ainda precisam arcar com o laudêmio pelo “domínio útil” das propriedades.
Para que serve o laudêmio?

Teoricamente, o pagamento do laudêmio, que é feito ao ramo de Petrópolis da família imperial, é aplicado na cidade. A taxa do laudêmio seria usada na conservação de prédios históricos e públicos da cidade, como o Palácio Imperial.
Em meio à tragédia causada pelas chuvas em Petrópolis, muito se tem discutido sobre a destinação desse valor ser revertida para o poder público municipal.
O deputado federal Marcelo Freixo (PSB-RJ), por exemplo, apresentou na última sexta-feira (18) um projeto de lei com este objetivo.
Tetraneto de D. Pedro alega que laudêmio é “espécie de aluguel”
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Herdeiro de D. Pedro II, o deputado federal Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PSL-SP) é tetraneto (neto do bisneto) do imperador.
Segundo informações de seu site oficial, ele esclarece que o laudêmio não deve ser visto como um imposto, mas sim “uma espécie de aluguel diferido”, pago somente em caso de transações.
Isso porque, segundo o parlamentar, o imóvel nunca teria sido comprado do proprietário original, Pedro II. “Isso significa que suas terras foram ocupadas e ele não desapropriou quem as ocupou. Ao contrário, deu titularidade e optou pelo sistema de laudêmio”.
“Nesse sistema o proprietário recebe a titularidade, beneficia o terreno e em caso de venda do imóvel repassa um percentual a família de Petrópolis herdeira do terreno original”, explica o site.
O ramo da família ao qual Luiz faz parte, a Vassouras, não recebe laudêmio desde 1940, quando a “taxa do príncipe” passou a ser exclusiva do ramo familiar de Petrópolis.
Laudêmio não é exclusividade da família imperial
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O parlamentar ainda justifica em seu site que o pagamento é erroneamente associado apenas aos descendentes da família real.
“Atualmente, sob o mesmo princípio, moradores de diversas localidades do Brasil têm de pagar a taxa à União, à Marinha ou mesmo à Igreja Católica. Mas os sistemas de laudêmio desses outros recipientes é diferente do sistema de Petrópolis. Cada um tem sua estrutura de pagamento”, informa o site.
O governo federal também faz arrecadações com o laudêmio, cobrando proprietários de imóveis em determinadas regiões do litoral brasileiro. Chamados “terrenos de marinha”, os compradores desses imóveis pagam uma taxa de 5% como laudêmio ao governo.
A cobrança também é um resquício do período imperial, onde esses terrenos foram criados para garantir a defesa do território e o livre acesso da população ao mar.
Na época, eles poderiam ser “tomados” pelos militares em necessidade de defesa. Porém, anos após a proclamação da República no Brasil e tantas mudanças nas marés, o conceito tornou-se incoerente.
A cobrança chega a afetar bairros inteiros em cidades do litoral de São Paulo, Rio de Janeiro, Pernambuco, Santa Catarina e Espírito Santo.
Propostas de término do laudêmio fracassaram
Vários projetos tramitaram no Congresso Federal pelo fim do laudêmio, porém, ainda não tiveram sucesso.
O argumento é que residentes e comerciantes das cidades afetadas pelo laudêmio são lesados pelo pagamento de mais um tributo que, há décadas, não tem correspondente contrapartida.
Segundo dados oficiais do Tesouro Nacional, em 2021 a União arrecadou mais de R$ 513 milhões em laudêmios e taxas de ocupação, pagas por quem mora em terrenos de marinha.