Hoje, se o Dalai Lama, o maior líder espiritual budista do mundo, viesse de novo para o Brasil, encheria vários Maracanãs com os seus seguidores. Seu livro, “A arte da felicidade”, conquistou não somente os adeptos desta religião que surgiu no século VI a.C. na Índia, mas todo público interessado em superar o sofrimento e buscar a luz que há no interior de cada ser. Só no Brasil, vendeu mais de 180 mil exemplares nos dois meses após o seu lançamento. Maria das Dores Pereira da Silva, a primeira monja budista do Brasil, recebeu do próprio Dalai Lama a condecoração do Buda de Ouro da Eterna Vida, por reconhecimento de sua fé e importância para o cultivo da religião no país.
O Budismo é considerado um caminho, um aprendizado. A partir de práticas como a meditação, somos capazes de desenvolver nossas melhores qualidades: consciência, bondade e sabedoria. A fé budista não se direciona para um Deus criador ou para deuses protetores, pois a meta do Budismo é alcançar um estado de total e completa realização da potência espiritual do ser humano, ou seja:
– Ver a coisas como elas realmente são – Sabedoria.
– Perceber a ligação sensível que possuímos com tudo o que existe – Amor.
– Cultivar um estado de energia incansável e inesgotável – Criatividade.
Mas quem foi Buda? Antes de mais nada, Buda é uma descrição e não um nome. Significa “aquele que está desperto para a realidade”. O primeiro homem que atingiu este estágio foi o príncipe Siddharta Gautama, nascido na Índia em 566 a.C. . Protegido pelas muralhas do palácio de Kapilavástu, o príncipe casou-se aos 16 anos e teve um filho, Tahula. Aos 29 anos, pela primeira vez atravessou a porta de sua casa e defrontou-se com um mundo miserável. Desde então passou a viver atormentado, até não agüentar mais e abandonar a riqueza e a família para procurar respostas para suas angústias. Vestiu um manto amarelo e foi para a floresta, de onde nunca voltou. Ao fim de um longo processo de privações e cansaço, à sombra de uma figueira, viu as incertezas de todas as coisas mundanas e encontrou-se com a Verdade. Neste momento, alcançou a Iluminação, recebeu o nome de Buda e passou a pregar para multidões por mais de 45 anos, até morrer com 80 anos de idade.
É interessante ressaltar que Buda não era um Deus, nem um profeta, tão pouco um ser divino. Buda sempre foi um ser humano, que através de muito esforço, transformou-se e transcendeu a sua humanidade. Depois de sua morte, o Budismo desapareceu da Índia por quase mil anos, sendo cultivado no Sudoeste da Ásia – Theravada, no Tibet, China, Mongólia, Japão, com diferentes nuances. No Brasil, o Budismo chegou com os emigrantes orientais na segunda metade do século XIX. No entanto, só atravessa a colônia para encantar outros brasileiros quase cem anos depois, com os movimentos culturais das décadas de 50 e 60.
Maria das Dores Pereira da Silva, carioca de 1906, pertencia a uma família tradicional e, já rompendo os limites que eram impostos as mulheres em sua época, formou-se em Medicina e Direito, profissão que exerceu até a sua conversão, em 1969. Apesar dos 40 anos dedicados ao culto e a divulgação do Budismo no Brasil, foi somente quando transformou-se numa monja budista que alcançou a sua realização. Para isso, precisou raspar os cabelos e se desprender de toda a materialidade do mundo.
Os monges budistas vivem reclusos nos templos, pois não têm a função de evangelizar ninguém, mas estar à disposição para esclarecer os interessados na religião. Maria das Dores, após a sua conversão passou a ser chamada de Tenko Shuei-Ni e a receber no Templo, em São Paulo, muitas visitas em busca de sua sabedoria. Compaixão, amor, paz e equilíbrio são as palavras que pregava em busca da iluminação. Esta lição, deixada pela primeira monja budista do Brasil, abriu caminho para uma maneira de ser totalmente diferente do espírito competitivo de nossa época.
Podendo ser exercido em casa, em um pequeno oratório, o Budismo é hoje um modo de viver e de pensar. Não há deuses a quem fazer pedidos e não é necessário freqüentar templos ou reuniões – o que facilita a vida dos moradores dos grandes centros urbanos. As meditações podem ser feitas em qualquer lugar. Mas para ser um mestre, é preciso muita disciplina, desprendimento de si e do mundo. Estas foram as mensagens de Tenko Shuei-Ni, cuja data de morte, ainda incerta, parece ter sido no final da década de 1970.