A antropóloga Mirian Goldenberg, autora do livro “Infiel – Notas de Uma Antropóloga” (Ed. Record), entre outros estudos e publicações sobre o assunto, comenta que os discursos da traição são quase sempre muito diferentes da realidade. “Muita coisa do comportamento se transformou, mas essa representação não muda: o homem, com o privilégio de trair; a esposa vítima; e a amante, vista como uma mulher mais liberada sexualmente. Só que isso não corresponde à verdade. A outra é tão prisioneira quanto a esposa, muitas vezes até cega diante da realidade porque é comum que ela se imagine como a verdadeira. Que o amante só está casado por obrigação”, comenta. Tudo em nome da exclusividade. “Amantes e esposas, ambas precisam se achar especiais pra justificar sua existência”, acrescenta Mirian.
Amantes e esposas, ambas precisam se achar especiais pra justificar sua existência
Sobre si e sua condição de oficial, a médica Renata*, 30 anos, confirma sua necessidade de ser única na vida do marido. “Não quero dividir homem com ninguém. O que é meu, é meu e tá acabado”, sentencia ela, que se separou há dois anos quando descobriu que o ex-marido estava com outra. “Vi e-mail e mensagem de celular marcando encontro e falando baixarias. Para mim, acabou na hora. É muito fácil chegar em casa e encontrar a mulher toda arrumadinha, cheirosinha depois de ter passado a tarde toda com uma vagabunda oferecida, que não tem respeito por si e se submete à humilhação de ser a outra”, diz, irritada. “Se você lesse o que eu li, também ficaria transtornada”, acrescenta.
Para Mirian Goldenberg, a traição se constituiu num grande problema da vida afetiva em função dessa carência de exclusividade. E não se trata de uma questão de moral. “Hoje, mais do que antigamente, quando não era possível se separar, as pessoas só ficam num relacionamento quando são únicas e especiais. Sejam como outras ou como esposas”, finaliza.