Rapper leva filha ao médico todo ano para monitorar hímen: conduta é ineficiente e prejudicial

Recentemente, o rapper norte-americano T.I. deu uma declaração polêmica ao participar de um podcast; questionado sobre suas filhas, ele afirmou que leva Deyjah Harris, de 18 anos, ao ginecologista anualmente, mas não por preocupação com a saúde da moça, e sim para checar a integridade de seu hímen.

Rapper T.I. monitora o hímen da filha e declaração choca

Em entrevista ao podcast “Ladies Like Us”, o rapper disse que leva Deyjah ao ginecologista todo ano desde o aniversário de 16 da filha e que, lá, ela precisa assinar um termo autorizando o médico a revelar detalhes dos exames para o pai. A razão disso, segundo ele, é checar se ela ainda é virgem.

“Fazemos visitas ao ginecologista para checar o hímen dela”, disse ele no papo, se referindo à membrana que fecha parcialmente o canal vaginal e costuma se romper durante o ato sexual ou sob outras circunstâncias. Sob risos das apresentadoras, ele disse que marca a consulta de surpresa, e expôs a intimidade da filha.

“No aniversário de 18 anos dela, o hímen ainda está intacto”, disse ele. Durante o podcast as críticas das apresentadoras ocorreram entre risadas, porém, nas redes sociais os internautas foram categóricos ao afirmar o quão problemática é a atitude do cantor – a ponto de o episódio ter sido excluído.

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“Imagine seu pai indo a um programa de rádio para discutir como ele monitora seu hímen e contando a todos seu ‘status virginal’ como se seu corpo fosse da conta de todos”.

“A coisa mais assustadora sobre essa situação envolvendo o T.I. é, ok, mas o que ele faria se o hímen dela não estivesse mais intacto. O que ele se sentiria no direito de fazer para discipliná-la? Eu estou… Enojada”.

“O T.I. supostamente indo ao ginecologista com a filha para assegurar que o hímen dela está intacto é invasivo e abusivo. Especialmente quando um hímen intacto não significa a ausência de penetração vaginal, e a ausência do hímen não significa que sexo consensual aconteceu”.

O que dizem os especialistas

De acordo com o rapper, durante as consultas ele foi alertado pelo médico sobre o fato de que ter uma relação sexual não é a única forma de uma mulher ter seu hímen rompido – e, apesar de ele dizer não ter se importando com o aviso, isso é algo importante de se ter em mente.

Conforme explica Fernanda Pepicelli, ginecologista e obstetra da Clínica MedPrimus, o hímen (membrana levemente elástica com uma abertura no centro), resiste, na maior parte das vezes, à inserção de um absorvente interno, mas, se não houver cuidado na hora de retirá-lo, é possível que o rompimento desta membrana aconteça.

A masturbação, segundo ela, também é outra situação em que o hímen pode acabar se rompendo. “Com o dedo, ele dificilmente se rompe, mas com brinquedinhos isso pode acontecer”, explica a médica. Além disso, ela também cita a possibilidade de o rompimento ocorrer a partir de um acidente que afeta a região.

“Dificilmente rompemos o hímen com impacto, vemos mais quando há um trauma importante, onde a pessoa realmente se machuque”, diz. É importante ressaltar também que a relação sexual não se resume à penetração vaginal, então é possível que uma mulher faça sexo (anal, oral, troca de carícias) e ainda tenha a membrana intacta.

Outro ponto que invalida a “checagem” feita pelo rapper para saber se a filha ainda é virgem do ponto de vista médico é o fato de que há vários tipos de hímen. Enquanto alguns são frágeis e se rompem na primeira relação, outros são elásticos e permitem a penetração sem se romper durante mais tempo ou simplesmente não se rompem.

É o caso do hímen complacente, que, segundo o ginecologista e obstetra Rodrigo da Rosa Filho, tem a forma de um “anel” como o anular, mas não se rompe facilmente. Em alguns casos, ele se rompe apenas a partir de intervenções cirúrgicas (feitas apenas quando ele gera desconforto para a mulher) ou se ela tem um parto natural.

Comprovação da virgindade: atitude é nociva

Além de a conduta do rapper não fazer sentido do ponto de vista médico, a psicóloga Renata Bento afirma que essa “fiscalização” e a exposição da moça não é uma situação nada positiva. “Exigir exames de comprovação de virgindade e agendar consultas-surpresa é uma invasão, é uma forma deturpada de mostrar cuidado”, diz.

Conforme explica a especialista, é possível que, a partir dessa invasão, a jovem fique com seu psicológico prejudicado. “Esse tipo de atitude pode provocar insegurança, dificuldade no processo de autonomia e independência”, explica, ressaltando também que há até potencial para que ela seja mais suscetível a abusos no futuro.

quote:” Exigir exames de comprovação de virgindade é uma invasão, é uma forma deturpada de mostrar cuidado” Renata Bento, psicóloga.

Isso porque, caso a filha do rapper tenha uma saúde mental íntegra, ela tende a se incomodar e lutar pela própria privacidade, mas, caso ela tenha um psicológico mais frágil, pode confundir esse controle excessivo com uma atitude de carinho e cuidado – levando isso adiante na vida.

“Isso pode fazê-la interpretar atos de abuso como se fossem manifestação de amor, deturpando os relacionamentos”, afirma. Além disso, ela também lembra que a exposição da conduta durante a entrevista também é bastante prejudicial para a saúde mental dela (e de qualquer outra mulher que passe pelo mesmo).

“Além de invadir a privacidade, [o pai] expõe o fato como ‘prêmio’. Isso é colocá-la diante de uma situação de abuso emocional, e pode ser difícil para a menina compreender isso, uma vez que surge de alguém que deveria preservá-la”, esclarece Renata.

Qual é a conduta adequada?

A sexualidade é parte natural do ser humano e discutir o assunto com os filhos é algo essencial – mas não por meio de uma invasão da privacidade deles. “O sexo não deve ser tratado como tabu, conversar com naturalidade ajuda a aproximar. A conversa favorece a intimidade para que os filhos fiquem livres para perguntar”, diz Renata.

Apesar de a descoberta da sexualidade, em geral, começar na infância e ser marcada por mais curiosidade sobre o assunto na adolescência, a psicóloga explica que não há consenso sobre a “hora certa” de abordar isso entre pais e filhos. Aqui, é preciso avaliar cada caso separadamente.

“As experiências de prazer se iniciam durante a primeira infância através do toque e das sensações no próprio corpo. O desejo sexual vai surgir com mais evidência durante o período da adolescência, que é também quando se inicia a vida sexual, mas não existe uma idade determinada, isso é muito pessoal”, afirma.

Independente da idade em que isso ocorra, porém, o papel dos pais é o de cuidar da filha ou do filho, bem como assegurar que eles têm acesso a informações confiáveis. No caso de mulheres, a psicóloga destaca a necessidade de encaminhá-la para um ginecologista, mas sem fazer “terrorismo”.

“[É saudável] orientar a filha, escolher o médico e acompanhá-la na consulta, deixando-a, se necessário, conversar com privacidade em um momento. Orientar sobre a necessidade de consultas anuais e a importância dos exames demonstra interesse e cuidado pela filha”, conclui.

Educação sexual