Engravidei seis vezes e perdi três bebês. Nunca soube o que é enjôo. Eu fumo e a primeira coisa que faço é parar de fumar. Nem sinto vontade de fumar. Passo muito bem, tive problemas físicos sérios. Vivia muito preocupada, mas sempre tive a idéia de que se alguma coisa poderia acontecer seria comigo e não com a criança.
Na perda do meu primeiro bebê, eu achava que tinha que passar por aquilo, mas tudo terminaria bem. Era o processo. Eles me explicaram que não deu para vê-la no parto porque ela tinha que ir logo para a UTI. A minha mãe sempre me apoiou muito, minha família em geral, tive muito apoio mesmo. Foram todos à maternidade, me visitaram. Todos me levaram presentes. Era co-mo se tudo fosse normal. Eu a conheci 48 horas depois que ela nasceu. Era um neném perfeito, apesar de ter nascido com 28 se-manas. Só que era pequenininha como se fosse uma boneca e cabia numa caixa de sa-patos. Era um neném maduro. Passei a ler muito sobre essas coisas. Vi que muitas pessoas tiveram sucesso. Não tive mágoa, nem ódio. Me conformei. Na UTI só eu podia entrar, eu visitava, ficava o tempo que quisesse, queria tocá-la. É triste você ver seu filho todo entubado, de capacete, com agulha para tudo quando é lado. Até que 21 dias depois ela veio a falecer. Então vi que nada era cor-de-rosa.
Dois meses depois fiquei grávida. Um dia estava dando aula, às 13:15, senti uma dor no abdômen muito forte e ele se avolumou, pensei que estava cheia de gases. A dor con-ti-nuou. Disse a uma amiga que ia para casa. Peguei o carro e fui para a casa de minha mãe Cheguei lá só estavam a minha avó e a empregada da minha mãe. Disse a elas que não sabia o que tinha e fui me deitar. Quando deitei, desfaleci. Tirei uma trompa e fiquei com a outra, achei que não ia mais ter filho. Meu marido colocou na cabeça que nós não íamos ter mais filhos. Fiquei muito deprimida. Achava que tinha falhado como mu-lher. Achava que não era capaz de gerar um filho.
Seis meses depois fiquei grávida de novo, feliz e apavorada. Liguei para o doutor e ele ficou apavorado, mas disse que não havia de ser nada. Para tocar para frente. Tive muita esperança, sempre preocupada. Não comprava nada, não falava da minha gravidez. Um dia fui ao banheiro e saiu uma gota de sangue. Aí o mundo desabou. Liguei para o mé-dico, fiz uma ultra-sonografia. O sangue aumentando. Fiquei de repouso. Tive uma có-li-ca, fui ao banheiro e foi embora tudo. Não olhei. Dei descarga, gritei e não deixei nin-guém ver. Todos da minha família ficaram boquiabertos porque perdi outro filho. O dou-tor falou para eu e meu marido irmos num geneticista. Fomos. Ele pesquisou, per-gun-tou, fomos outra vez O doutor falou para mim que ia fazer uma radiografia do colo do meu útero. Eu teria que ficar menstruada para fazer a radiografia. Só que fiquei grá-vida.
A minha vontade de ter filho era enorme. Evitava na cabeça, mas não evitava e meu marido também não. Era uma coisa meio maluca. As pessoas diziam para eu parar, com medo que eu morresse. Diziam para eu adotar. O meu geneticista me disse que não deveria ter ficado grávida. Fiquei com raiva dele. Nunca mais fui lá, nem para pegar o resultado do exame. Proibi a minha família de comprar qualquer coisa para o neném. Estava grávida, mas não comentava nada. Minha mãe comprou milhões de coisas escon-di-do. Entrei em trabalho de parto e não tinha nada pronto para ir para a maternidade. Não queria que ninguém comprasse nada. Queria deixar rolar para ver até onde ia chegar. Passei a gravidez trabalhando, sem nenhuma dor de cabeça. Nunca enjoei. Só engordei. Em todas engordei feito uma maluca.
Eu não me entusiasmava muito. Estava grávida e não estava ao mesmo tempo. Não tinha nenhuma sensação, não me permitia ter. Podia até me pegar pensando no bebê, mas não me enchia de esperança. Entrei em trabalho de parto. Foi parto normal . Quando o Guilherme nasceu e o colocaram ele perto de mim, perguntei se ele era perfeito e se estava bem. Aí relaxei. Queria ficar sozinha, queria me conscientizar que tinha tido um filho, mas não fiquei muito eufórica, porque eu tinha medo.
Depois sosseguei. Estava contente da vida com o neném. Fui para Salvador muito confiante. De repente estava grávida de novo. Eles têm um ano e meio de diferença. Não foi planejado, mas acho que queríamos. Queria que meu filho tivesse um irmão. Achei ótimo ter ficado grávida. Eu curti mais desta vez. Foi uma gravidez muito boa. Comprei coisas, me preparava. Soube que era outro menino. Adorei ter outro menino. Queria ter outro filho homem. Como tive a menina, não queria ter outra filha mulher para não substituí-la. Tenho isso dentro de mim. Foi uma gravidez completamente diferente. Guilherme fez um ano, fiz um festão pa-ra ele, tirei retrato da minha barriga com o Guilherme pondo a mão nela. Tenho mi-lhões de retratos da gravidez que até então não tinha. Comprei coisas, arrumei o quarto. Não fiz curso , mas li muito.
Engravidei do meu terceiro filho três anos depois , amamentei todos os três só não gostava da prisão que a amamentação acarreta para a mulher. No terceiro filho fiz cesariana para ligar e não gostei. Gosto de família grande, curti muito ter podido depois de tudo ter tido três filhos. Eu acho que vale a pena a gente ter filho, mas não é uma coisa fácil, não. Acho que a me-lhor parte da maternidade é a gravidez, porque você manda na sua vida a hora que quer, dorme a hora que quer. A mulher que quer ser mãe tem de estar preparada para abdicar de algumas coisas. Acho que não tem solução. Acho que não é fácil, mas compensa.
Trechos retirados do livro “Maternidade: que delícia, que sufoco” Ed. Objetiva. Vendas pelo tel: 0800-224466